Há alguns meses eu venho sentindo uma
certa inquietação, que eu não sei bem de onde vem. Um comichão por dentro, me
pedindo: “escreve, escreve, escreve”. E eu pergunto: “mas escrever o que?” “Sei
lá, só escreve”. Então eu sento pra escrever e você pode ouvir o farfalhar das
bolas de feno rolando dentro do meu cérebro. Nem um bilhete. Nem sequer um post
pro blog, coitado.
Ando com três diferentes cadernetas na
bolsa, todas bem lindas, com papel de gramatura 120. As três contém apenas
contas e listas de supermercado. E olha que eu tenho pensado bastante, mas o
caminho da ideia pro papel tem parecido mais longo do que de costume, a vida
parece andar barulhenta demais e a minha autocrítica mais cricri que mãe judia.
Ainda assim, esse comichão persiste me
aborrecendo. Eu o espanto feito uma abelha chata, e tal qual o persistente
inseto, ele volta zumbindo cada vez mais alto. E vem de mãos dadas com o outro
comichão, que repete “odeio meu trabalho, odeio meu trabalho, odeio meu
trabalho”. As vozes na minha cabeça são assim, preguiçosas e metidas a
literatas.
E fazem com que eu me ponha a sonhar
com uma outra vida, uma vida em que eu conseguiria escrever e me tornar de fato
uma escritora, vivendo em um país onde seria possível me sustentar dignamente
sendo apenas escritora e calar a boca dessas duas vozinhas extremamente chatas
– e da mais chata de todas, aquela que fica repetindo: “mas você nem tentou”.
E não acho que um dia eu vá chegar a
tentar realmente. Me parece um pouco absurdo demais sequer imaginar uma coisa
dessas. Não tenho essa pretensão, mesmo.
Só que não consigo mais não fazer nada
a respeito dessas malditas vozes. Então criei uma pasta super secreta e
protegida por senha no computador, onde salvo algumas crônicas bem vergonhosas,
as quais nunca mais abro depois de terminar. E ando com uma certa vontadezinha
de leve de me matricular em um curso de escrita criativa, desde que ninguém
exija ler nada meu em público, desde que eu possa ficar bem quietinha ali no
fundo da classe. Não sei se tem algum em SP, isso parece tão coisa de filme de
nova iorquinos tentando se encontrar na vida. Será?
Talvez tenha alguma coisa a ver com meu
signo saindo de sua fase de eclipses, talvez seja só o peso da idade jogando
meus sonhos frustrados em minha cara. Talvez eu deva tentar ser um pouco menos
dramática e simplesmente encarar isso como um hobby, como corte e costura ou
jardinagem. Que é a única coisa que a escrita pode ser para mim hoje. E tudo
bem, não tem problema que ela seja só isso. Ela só precisa ser.
Um comentário:
Eu preciso dar meu testemunho. Como lá em casa essa coisa de escrever para viver é normal, já que meu pai também é jornalista, escrever enquanto artista era uma coisa que nunca me passou pela cabeça.
Eu precisei ter quase 40 anos para descobrir que era capaz de escrever coisas tão legais, tão legais (muito modestamente). Fiz uma oficina de escrita criativa que me fez perceber que praticamente todo mundo que é alfabetizado é capaz de escrever coisas sensacionais.
O lance todo da coisa é que essa história de pasta com senha não rola. Não tem nada mais incrível do que escrever em grupo, um dando pitaco no texto do outro.
Aliás, a gente se reúne a cada 15 dias na minha casa e se você estiver a fim, está mais do que convidada.
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