segunda-feira, março 28, 2005
Existem quatro palavrinhas que eu detesto: para sempre e nunca mais. Elas me fazem pensar, com desconforto, na idéia de inevitabilidade, de imutável, de certeiro. E a morte tem o poder de ser o para sempre e o nunca mais, ao mesmo tempo. De todas as coisas que já pensei a respeito da morte, nunca tinha chegado nem perto da sensação que ela provoca de verdade: pequenez, indignação, dor e, mais do que tudo, uma solidão tão grande que parece que você nunca mais vai amar ninguém. Ou pior: que ninguém nunca mais vai te amar. Esses últimos dez dias foram absolutamente surreais e eu ainda acordo achando que foi um trote. Não é possível para mim conceber, ainda, que minha mãe não vai estar lá me esperando sentadinha no sofá, não vai mais me ligar aos sábados para saber como foi minha semana, não vai mais me abraçar nem me beijar daquele jeito morninho, mais gostoso que leite quente com Ovomaltine. Metade de mim foi arrancada sem anestesia, levada embora para sempre: minha maior companheira, minha melhor amiga, meu maior amor no mundo e também a única pessoa que sempre me amaria incondicionalmente. Aquela com quem eu me comunicavam sem precisar dizer uma palavra; para quem eu podia dizer tudo sem me preocupar em escolher palavras ou pensar duas vezes; para quem eu podia dizer absurdos e pedir perdão mil vezes - e ter meus pedidos mil vezes aceitos com sinceridade. Vou ter de aprender a viver sem isso, a viver com só metade de mim, e é estranho, pois continuo sentindo como se essa metade ainda estivesse aqui. Deve ser a mesma sensação das pessoas que amputam membros e continuam sentindo eles coçarem. Me disseram que isso melhoraria com o tempo, mas o tempo só tem me feito enxergar a amplitude dessa ausência, como ela estava presente em absolutamente todos os meus atos, e agora não está mais. Acordar dói. Respirar dói. Pensar dói. Receber pêsames dói. Eu gostaria de conseguir congelar o tempo nos momentos em que me sinto bem, em que penso nas coisas alegres que vivemos juntas (e, graças a Deus, são muitas), em que consigo ter certeza de que ela estará sempre perto de mim, só que livre de tantas dores. Quando penso nisso, fico bem, fico quase feliz. Mas tudo é muito rápido, os sentimentos ficam se sobrepondo o tempo todo e eu tenho muito medo do que ainda está por vir. Tudo o que eu queria agora era que existisse uma Morfina para a alma da gente, qualquer coisa que fizesse essa dor absurda diminuir. Mas não há. Ela se foi, eu fiquei. E vou ter de aprender a viver assim: pela metade.
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