sexta-feira, dezembro 19, 2003

RECEITA DE ANO NOVO
(Carlos Drummond de Andrade)

Para você ganhar um belíssimo Ano Novo
Cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)

Para você ganhar um ano não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia, se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens (planta recebe mensagens? Passa telegramas?).

Não precisa fazer listas de boas intenções para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido pelas besteiras consumadas
Nem parvamente acreditar que por decreto da esperança
A partir de janeiro as coisas mudem e seja tudo claridade, recompensa, justiça entre os homens e as nações,
Liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
Direitos respeitados, começando pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano-Novo que mereça este nome,
Você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo de novo,
Eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano-Novo cochila e espera desde sempre


É isso aí. Até 2004, macacada.

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